sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Aprendiz de sapateiro

Foi um acontecido do ano que passou. Um jovem fora chamado, junto com mais outros dois, para se tornarem aprendizes numa sapataria de um turco. Em uma semana um deles fora mandado embora devido a um pequeno desentendimento com um dos seus superiores. Mas voltemos ao outro jovem que protagonisa a pequena história.

Era uma manhã de uma quarta feira. Seu lombo doía graças ao seu sapato de novato, que era sem solado, contudo singular e com um estilinho despojado. Pensava apenas em sua amada e em sua futura viagem juntos para uma sonífera ilha, onde o amor é tão belo como uma onda no mar. Enquanto esse pensamento martelava em sua cabeça, um senhor adentra na loja e lhe pergunta:

- Queria um tênis semelhante ao meu, que fosse tão confortável e tão bom quanto ele!

O senhor trazia consigo um sotaque carregado de argentino, o garoto observando a marca do tênis do velho, não esperava que ele lhe fosse lhe apresentar alguamas idéias interessantes. Bom, sigamos...

- Os tênis da marca que o senhor quer estão aqui. Posso lhe trazer esse, ou esse aqui talvez...

- Eu quero um parecido com este! Pra caminhar e que seja bem confortável

- Então está certo. Trarei esse aqui.

- Não, não. Não gostei desse tipo não.

- Que tal esse?

- Não, também não. Você é surdo, meu rapaz?

Como o velho notou uma torcida de nariz do menino, logo mudou de tática.

- Que tal assim: você me traz esse aqui e esse outro, e veremos então.

E lá foi o garoto mergulhar na estocagem para ver se encontrava os tênis pedidos. Subiu e o velho começou a experimentá-los. Veste um, veste outro. Anda um pouco pra cá, um pouco pra lá.

- É, não fazem mais as coisas como antigamente. A anos compro meus tênis aqui, e tudo parece mudar de ruim pra pior. Vou lhe dizer uma coisa, mas primeiro preciso saber de outra. Você não trabalha aqui a muito tempo, certo?

- Acho que está estampado em minha testa. Não gosto de trabalhar com comércio. Me dá uma canseira braba. Prefiro ler meus livros e estudar com calma. É bem melhor.

- E o que estudas?

- Letras, latim, na federal do rio de janeiro - enchendo a boca de orgulho.

- Pois bem, o que vou lhe dizer agora é um ensinamento pro resto da vida. Agora, preste atenção! - pigarreou e prosseguiu - O homem, desde o momento que nasce, quer fazer as coisas, sempre e tudo. Desde falar até brincar. Depois de passada essa fase, começa a observar, a aprender, a querer saber das coisas que lhe cercam. Num momento seguinte, começa a buscar a aprender a saber fazer as coisas da vida. - calçou o outro par de tênis que lhe foi entregue e continuou - Daí, ele começa a passar tudo, ou pouco, que aprendera até então, ou ao menos tentar passar boa parte das coisas que lhe foram ensinadas. Com o tempo compreende que é preciso aprender mais e mais, para que possa ensinar mais e mais, ou fazer mais e mais. Essas são as máximas da progressão da atividade do homem na Terra: fazer, saber, saber fazer, fazer saber, saber muito mais e fazer muito mais. Exatamente assim, gradativamente. Vou levar esses aqui. Onde jogo esses meus velhos fora?

- O senhor vai mesmo querer jogá-los fora?

- Vou. Já não me prestam pra nada. Vê?

- Então se não lhe for muito incômodo, gostaria de ficar com eles. Esses meus aqui me matam as costas.

- Que fique e que faça um bom proveito, meu jovem. Deles e de tudo que lhe falei até agora.

- Gostaria de atender mais pessoas como o senhor. É bem raro encontrar pessoas assim tão dispostas a nos ajudar.

- Num mundo como esse é quase impossível. Criei meu único filho e fui levando minha vida ensinando e lidando com o comércio para que ele pudesse ter uma boa vida. Mas ele morreu aos seus vinte e sete anos. E eu, que enterrei-o, já não tenho mais nada o que fazer aqui a não ser isso.

- Sinto muito. De coração.

- Não se incomode tanto. Isso já tem um bom tempo. É uma dor singular. Mas precisamos seguir a vida. Saber muito, para ensinar muito mais.

- Acho que terei uma vida boa.

- Assim espero, meu jovem. E vejo que tens um futuro promissor

Após um rápido procedimento de pagamento, o senhor sai, não tão satisfeito com seu par de tênis, mas com o que pode ensinar para aquele jovem aprendiz da vida. E o jovem, que passava o dia inteiro pensando em sua viagem com sua amada, agora pensava ainda com mais vontade, com mais força. Porque é isso que precisamos ter para pordermos aprender, e para que possamos ensinar. Sem nunca desistir de nada que queiramos muito. Seja qual for o objetivo.

2 comentários:

Carolina disse...

Essas pessoas mais velhas... têm tanto a ensinar...
Por isso que eu amo velhinhos!

Kayo disse...

foda...
cara, partiu escrever um livro de contos de aprendiz de sapateiro!

tenho que passar um livro do sallinger, ou melhor dois! "nove estórias" e "franny and zooey"